Por Raquel António, Psicóloga e Investigadora
Blog "Famílias No Bully"
Na circunstância excecional que vivemos, o uso de ecrãs pelas crianças e jovens passou a ser uma rotina diária necessária para colmatar as necessidades de estudo, entretenimento e socialização, o que implicou um maior acesso e mais tempo de utilização.
Se antes da pandemia o acesso excessivo à internet estava já relacionado com a prevalência de violência online e cyberbullying, com as fases de isolamento decorrentes da pandemia, o fenómeno pareceu intensificar-se mais.
O cyberbullying consiste na utilização da tecnologia para assediar, ameaçar ou vitimizar outra pessoa de forma repetida. Este tipo de bullying realizado através de meios digitais pode acontecer em qualquer lugar e a qualquer hora, para além dos portões das escolas; possibilita o anonimato da pessoa que agride e pode gerar diversos efeitos negativos nos alvos, como tristeza, sintomas de ansiedade e depressão, isolamento, solidão.
Em 2020, realizámos um estudo relativo ao 1º período de confinamento obrigatório e de ensino à distância e verificámos que que 61% dos 485 jovens que participaram no estudo afirmaram ter sido vítimas de cyberbullying e que oito em cada dez foi testemunha deste tipo de comportamento online[1].
Em 2021, realizámos um segundo estudo relativo ao 2º período de confinamento obrigatório e de ensino à distância [2], com a participação de 952 estudantes de todos os distritos do país e verificámos que a prevalência deste tipo de agressões foi mais elevada do que a reportada no 1º confinamento de 2020.
Mais de 70% dos estudantes foi vítima de bullying online por mais de uma situação durante o 2º período de confinamento provocado pela pandemia, período em que as aulas decorreram virtualmente.
Do total de estudantes inquiridos, 8 em cada 10 admitiu ter observado situações de bullying online, mas apenas 60% destes fez afirmou ter intervindo para impedir a continuidade da agressão. Com a maioria dos alunos a considerar que existiu um aumento de mensagens e conteúdo prejudicial e violento, são necessárias medidas mais eficazes no combate ao cyberbullying e de intervenção junto dos/as jovens sobretudo em questões relacionadas com a partilha de conteúdo íntimo.
O efeito multiplicador das tecnologias de comunicação e das redes sociais possibilita chegar a um maior número de pessoas (testemunhas ou observadores), prejudicando muito rapidamente o alvo destas mensagens, imagens e vídeos ofensivos e humilhantes. Além da rapidez com que este conteúdo violento se difunde, existe a dificuldade em parar ou apagar definitivamente aquilo que foi partilhado – tornando este tipo de bullying ainda mais difícil de controlar, combater ou de esquecer. A vítima ou o alvo deste tipo de situações pode não saber de onde vieram as mensagens ou publicações, nem quantas pessoas já viram esse conteúdo partilhado.
É por isso que é tão importante que todas as pessoas reflitam muito bem antes de partilhar ou enviar uma imagem ou vídeo a quem quer que seja e que possa, no futuro, usar essa imagem ou vídeo para humilhar ou chantagear.
É igualmente importante guardar as provas (e.g., mensagens, emails) para que possam denunciar a situação; bloquear a pessoa ou as pessoas que estão a praticar este tipo de agressões ou denunciar o conteúdo abusivo nas redes sociais.
Além disso, é essencial reforçar a ideia de que, se forem testemunhas, não devem encaminhar ou responder a mensagens (e.g., textos, áudios, fotos, vídeos) que possam ser ofensivos ou perturbadores para os seus amigos (ou desconhecidos!) – devem antes apagar ou denunciar o conteúdo, ou guardar as provas caso conheçam o alvo e possam ajudar na denúncia – não fazer parte do problema, mas sim da solução.
É igualmente fundamental o papel de prevenção que a comunidade escolar, encarregados de educação e restantes cuidadores devem ter, consciencializando os mais novos para os riscos da utilização de telemóvel/computador/tablet e tentar proteger as crianças e jovens desses riscos, promovendo a utilização segura da internet, a partilha consciente de conteúdos, e esclarecer os efeitos positivos e negativos da utilização da tecnologia.
É necessária uma cultura de prevenção sobretudo da partilha de conteúdo íntimo, da promoção de empatia e da denúncia de conteúdo abusivo para prevenir situações de bullying online.
Fontes: